Tuesday, October 24, 2017

Tradução: Faz a Tua Escolha



Neste excerto da conversa que Thomas Yellowtail, líder espiritual dos índios Crow do Montana, manteve com o seu filho adotivo Michael Fitzgerald (que mais tarde editou esta e outras conversas), são focados pontos pertinentes à Filosofia Perene, desde a falta de sentido do mundo moderno, do estado de antagonismo em que sobrevivem as atuais sociedades humanas, à necessidade da busca de sentido e da importância dos rituais e da oração como veículos para manter o contacto com o Divino, até à unidade suprema de todas as formas tradicionais de espiritualidade.

O Mestre índio exorta todos a abrir os olhos, a acordar do presente estado de sonambulismo e seguir o caminho sagrado, que pode inclusive revestir várias formas, já que os tempos atuais, tempos finais de decomposição – como previsto nas profecias ligadas às mais diversas religiões – apresentam em maior contraste que nunca a distância que o profano se encontra do Sagrado.

Uma nota importante para a carta dirigida líder tradicional índio Thomas Banyacya ao então Presidente Nixon, onde revela as várias profecias Hopis que prefiguram o fim do mundo, que entretanto se realizaram.


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Nos tempos antigos os índios tinham a sua liberdade e seguiam as suas vias tradicionais. Então os brancos obrigaram-nos a instalarmo-nos em reservas. O povo teve então de viver junto e não eram livres para viver da nossa maneira natural. O povo também perdeu de vista o verdadeiro significado das suas tradições. Não demorou até que os poderes e as coisas sagradas que foram dadas aos índios dele foram. Isso foi o que foi dito pelas profecias antes do tempo da instalação nas reservas. Muitos homens-medicina que tinham boa medicina, bons poderes, perderam-nos. Tudo isto aconteceu gradualmente durante os últimos cem anos, até hoje existiram menos e menos homens com poderes e conhecimento espiritual menores. Aqueles que ainda têm dádivas espirituais ou medicina – e sobram uns poucos – não têm um poder tão grande como nos tempos quando os índios ainda eram livres para vaguear o país e viverem do modo tradicional. Com a passagem do tempo, os índios tornaram-se mais “civilizados” e instruídos para viverem do modo do homem branco, e então todos os poderes espirituais foram diminuídos. As pessoas perderam de vista a religião e a prece, pelo que parece que as velhas profecias estavam corretas. Nos tempos em que éramos livres, quando o nosso povo sabia mais da Natureza e das coisas importantes, quase todo o homem tinha poderes medicinais e a única vida que o povo conhecia era centrada no sagrado. Os verdadeiros homens-medicina podiam operar milagres nesses dias. É na verdade o mundo moderno e a “civilização” que estão a fazer-nos perder todas estas coisas. Nos tempos antigos, o povo tinha os seus valores centrados nas preocupações espirituais. Os Poderes espirituais, os dadores de medicina, estão tirar-nos essas coisas sagradas porque já desconhecemos como guarda-las corretamente.

Os índios modernos tomam pouco cuidado das coisas espirituais e das vias tradicionais, portanto existem muito poucas pessoas com a verdadeira medicina ou entendimento. A civilização moderna não tem entendimento sobre as matérias sagradas. Tudo é invertido. Isto torna ainda mais importante que os jovens sigam o que hoje resta. Apesar de muitas das vias sagradas já não se encontrarem entre nós, o que nos resta é suficiente para todos, e se é seguido poderá levar tão longe até quanto uma pessoa possa ir. Os quatro ritos que nos restam formam o centro da religião: a tenda do suor para purificação; a visão-missão para o retiro espiritual; a prece diária com oferenda do tabaco para fumar; e própria a Dança do Sol.Com tudo isto, qualquer pessoa sincera pode realizar o seu centro espiritual interior.

É importante que as novas gerações entendam a diferença entre as vias tradicionais e o mundo moderno em que hoje vivemos. Já antes falei acerca do suporte sagrado que sempre esteve presente para os índios tradicionais. Com este suporte em todo o lado, do momento em que se acorda até à primeira oração do dia, até ao momento de deitar, podia-se pelo menos ver o que era requerido em ordem para levar uma vida própria. Até o que se levava vestido no dia-a-dia tinha significados sagrados, como os desenhos de contas na roupa, e onde quer que se fosse ou o que se fizesse, seja na caça, no fabrico de armas ou qualquer coisa que se fizesse, participava-se na vida sagrada e sabia-se quem se era e carregava-se um senso do sagrado no próprio. Todas as formas tinham um significado, inclusive o tipi [tenda] e o círculo sagrado da respetiva tribo. É claro que a vida era dura e difícil e nem todos os índios seguiam as regras. Mas o suporte da vida tradicional e a presença da Natureza em todo o lado trazia verdadeiras dádivas para todas as pessoas.2

O mundo que habitamos é bastante diferente. Os jovens de hoje não estão capacitados a ler os sinais da natureza e nem sequer tem conhecimento dos nomes dos diferentes animais. Quando um pássaro canta, ou quando vemos as impressões deixadas por um animal, a maior parte das pessoas não saberá o nome do animal que se encontra perto… O que é pior, muitos jovens nem sequer olham, ou às vezes nem querem saber, onde estão a caminhar e não observam as belas coisas que Acbadadea, O Criador de Todas as Coisas Superiores, criou. Quase me faz chorar ver como alguns jovens desaproveitam prendas preciosas. Eles deixam comida apodrecer ou gastam água e eletricidade. As pessoas não compreendem o valor das oferendas que lhes foram dadas; eles pensam que as coisas sempre ali estarão quando delas precisarem. Estas mesmas pessoas terão uma grande surpresa um dia, porque mais cedo ou mais tarde os seus erros serão demonstrados.

Repare-se na maneira em que as pessoas viajam e trabalham nos dias de hoje. Sempre se escuta as pessoas a dizer: “Vivemos na idade da velocidade.” Tudo tem sempre que ser rápido, de acordo com a maneira que as pessoas querem fazer as coisas hoje em dia. Se viajarmos uma grande distância, o destino ou o local para onde vamos não se vai mexer; ainda se mantém imóvel, portanto não há necessidade de estar em tal pressa. Em adição de não se sentir seguro, existem outros perigos neste modo de vida. É um problema com o seu inteiro modo de vida… As pessoas deviam-se perguntar o que é que elas estão a fazer e porque é que o estão a fazer. Tantas pessoas hoje nem sequer pensam; elas apenas fazem algo.

Muitas das coisas modernas que hoje possuímos tornaram tudo pior. Não tínhamos televisão até há poucos anos, e desde que a televisão começou a ser usada, as pessoas tornaram-se loucas por ela. É algo pela qual eu nada quero saber para mim. Torna as pessoas preguiçosas e dá-lhes estranhas ideias sobre a vida. Por exemplo, parece que a modéstia já não existe hoje em dia. Quando as pessoas vêm algo na televisão, elas pensam que é correto. Elas não pensam por si próprias; deixam que a televisão pense por elas. A televisão é algo que não é bom para o mundo. É tão má que a maior parte das pessoas não compreende como algo como a televisão pode arruinar todos os nossos verdadeiros valores.

Parece que tudo no mundo de hoje é feito para que todos possam continuar tão rápido que nunca têm de considerar porque é que lhes foi dado o milagre da vida. É mau de mais que as pessoas desperdicem a sua vida e a sua inteligência ao tornar-se parte desta sociedade. Se parassem por um instante e considerassem que todos eles morrerão e encontrarão o seu Senhor, pergunto o que então fariam?

Uma das razões pela qual a nossa sociedade é tão rápida é a máquina. A maquinaria mudou a maneira pela qual vivemos, e todos os nossos valores em relação ao mundo. Nos dias antigos, requeria-se trabalho manual para quase tudo. Todos tinham uma responsabilidade e todos se ajudavam mutuamente. Não havia dinheiro para manter e para possuir, portanto não se podiam adquirir mais coisas que o vizinho. Os antigos índios viajavam pelas regiões rurais e não podiam carregar consigo mais do que precisavam. As qualidades que o homem possuía em si eram as importantes, não as suas possessões exteriores.

Nesses dias, todos sabiam o que esperar de si e a Via Índia ensinou-o como a conseguir. Nem todos os antigos índios viviam de acordo com os deuses tribais, apesar de o centro sagrado estar presente. Hoje, algumas pessoas ainda rezam, como o devem, apesar do centro sagrado se encontrar praticamente oculto. Mas os objetivos da sociedade nesses dias e hoje são diferentes e isto é algo que todos devem entender. Falámos sobre o modo como praticamos a nossa Religião da Dança do Sol e como tudo tem um significado, um propósito. E tal era com tudo com que o índio dos dias antigos procedia, e tal assim devia ser hoje. Começar-se-ia assim a entender os mistérios deste mundo no qual fomos colocados para encontrar a morte, para entrar no mundo para além do qual não podemos ver.

Muitas das cerimónias da Dança do Sol são difíceis de aguentar; é uma provação para as terminar. Isto é bom e ajuda-nos a relembrar que existe uma maior responsabilidade na vida. A vida é um presente que se está libre de usar como se vê mais útil; mas também se deve entender que as ações de cada um, as suas escolhas, estão a ser observadas por poderes que não se enxergam. Se tudo é fácil para nós e se as nossas preocupações apenas são consideradas como nossas possessões, então perdemos de vista o que é importante. Em tempos difíceis, estamos sempre prontos para enfrentar a morte; talvez aconteça hoje. Então tal deve acontecer todos os dias em tudo o que fazemos. Devemo-nos preparar para encontrar Acbadadea, O Criador de Todas as Coisas Superiores. As pessoas pensam sempre que há tempo suficiente para rezar mais tarde. As pessoas que querem acumular mais riqueza estão sempre a pensar, “vou esperar até mais tarde.” O mundo hoje, e o modo como as pessoas fazem as coisas, encoraja as pessoas a serem preguiçosas nos seus deveres espirituais.

O trabalho manual já não é mais necessário; tudo é feito pela maquinaria. Um homem pode agora fazer um inteiro campo de feno por si próprio. O feno é cortado e embalado por máquinas; eles até possuem agora maquinaria que o apanha e o traz. Sem em nada tocar, a máquina coloca lá as embalagens e já se encontram na pilha. Muitos homens costumavam ser necessários para trabalhar muitos dias, mas agora o trabalho é executado praticamente num dia por estas máquinas. O cultivo de beterraba costumava ocupar vários homens; muitos trabalhadores são hoje eliminados pela maquinaria moderna. Homens que procuram trabalho menial de quinta quase não conseguem encontrar qualquer trabalho hoje. Ninguém deles precisa porque a maquinaria que eles possuem toma conta disso tudo.

Até na indústria do gado é do mesmo modo. Costumavam ser alguns vaqueiros que tomavam conta do trabalho do gado num rancho. Muitos deles não conseguem hoje encontrar mais trabalho. Agora existem máquinas que tomam o seu lugar. Portanto parece como se tivéssemos chegado ao tempo em que muitos bons homens não conseguem encontrar trabalho de todo. Tal não é como as coisas deveriam ser.

Nos dias de hoje, os homens querem acumular dinheiro e então usem o dinheiro para comprarem máquinas para que todo o trabalho possa ser feito mais rapidamente; poderão então acumular ainda mais dinheiro. Isso é tudo em que o homem rico pensa. Então o que fazer em relação ao homem que quer trabalhar para fazer a sua vida? Eles não têm trabalho e não têm nada para fazer, de todo. As pessoas começam então a trabalhar umas contra as outras, como se as pessoas sem dinheiro e máquinas começassem a odiar as outras. Muitas das guerras no mundo de hoje resultam deste problema…

Agora o que acontece quando um bom rapaz índio sai e encontra um emprego com bom e duro trabalho? Todos dele deveriam estar orgulhosos, mas não estão. A inveja é criada pelo facto de que as pessoas estão a competir umas contra as outras. Nas nossas reservas de hoje, as pessoas estão invejosas das outras. Ninguém coopera. As pessoas culpam-se umas às outras por todos os problemas, e criticam os que trabalham e ajudam os outros… Muitos podem perceber que o que vemos no mundo moderno é mau, que a maior parte dos valores que as pessoas hoje têm estão invertidos. Seguir o caminho do mundo-máquina não irá preparar para o encontro com o Criador seja nesta vida ou depois da morte.

É verdade que também não podemos apenas voltar aos velhos dias. Que bem faz desejar que se seja um índio antigo? Porquê criticar o teu irmão e tentar encontrar falhas em todos os outros? Irá tal tornar-te uma pessoa melhor porque decidiste que outro tem as culpas? Alguns índios encararão os seus problemas com uma garrafa. Isto é muito duro – drogas, também. Tal corrompe todos os nossos jovens. Como tal pode resolver os problemas? Tal apenas torna tudo pior, porque eles não tentam fazer nada em relação aos próprios. Estas mesmas pessoas esperam que lhes sejam dadas coisas pela tribo, o governo. Pensam que é a responsabilidade dos outros tomar conta deles… Não querem de todo saber da juventude. Tudo o que lhes interessa é o seu próprio bem-estar. Estes homens irão com certeza receber o seu justo prémio quando encontrarem o seu Criador.

Já falámos acerca da Religião da Dança do Sol e o que ela significa para nós. Pode-se ver que tudo é hoje muito diferente e que muitas das coisas sagradas e das vias sagradas que estavam com o nosso povo índio nos dias antigos se encontram hoje perdidas. Isto estava previsto acontecer, pelo que nós não as merecíamos manter porque já não as respeitávamos. Mas não é bom culpar qualquer pessoa ou país pela nossa situação presente. Todos estes acontecimentos foram previstos em todas as profecias sagradas de todas as grandes religiões.

Ninguém é de culpar pelo nosso presente estado. Todos os que falham viver de acordo com os seus deveres espirituais causam maiores problemas para todos. Portanto, eu digo às pessoas, “Não critiquem o vosso vizinho; isso não ajudará ninguém. Não é bom colocar índio a lutar contra índio; tal apenas torna as coisas piores. Trabalha em ti primeiro; prepare-te para encontrar o teu Criador.”

Todos podem ver como as coisas mudaram desde os tempos antigos, quando os valores sagrados estavam no centro da nossa vida, até aos dias presentes, quando a nossa sociedade parece não ter o sentido do sagrado. Tantos jovens preocupam-se no que acontecerá a este mundo que habitamos, e no que deveriam fazer se querem seguir o caminho espiritual. Eles podem pensar, “Existem outras pessoas que querem seguir a via sagrada? Tenho a oportunidade de seguir uma vida de acordo com as vias tradicionais?”

Se as pessoas continuam no curso presente, sem oração e sem respeito pelas coisas sagradas, então as coisas tornar-se-ão piores para todos. Muitas profecias das grandes religiões de todo o mundo falam sobre o fim do tempo. O Corvo tem uma profecia sobre este tempo, também.

A profecia do Corvo relaciona-se com um importante rito do Corvo: a Dança do Castor e a Dança do Tabaco. É a mesma coisa, mas é conhecida por ambos os nomes. É uma dança participada tanto por homens como por mulheres que são membros da Sociedade da Dança do Tabaco. A sociedade costumava realizar as suas cerimónias todos os anos. Não sabemos de outra tribo índia que tenha esta mesma dança. Podia chamar-se a dança do Corvo índia. A Sociedade do Dança do Tabaco tem uma dança de adoção para adotar novos membros para a sociedade, para que as cerimónias possam ser mantidas. Recentemente, muito poucos membros têm sido adotados e as cerimónias já não são mantidas tão frequentemente como o foram nos tempos antigos…

A planta que eles usam na cerimónia não é realmente um tabaco. O nome do Corvo usado é Itchichea. É muito sagrado. Nos dias antigos, todos os anos, eles plantavam o tabaco numa cerimónia especial na Primavera, usualmente em Maio. Eles colhiam-no no Outono e mantinham a planta e as sementes e iniciavam o processo de novo na Primavera seguinte. Até quando eu era jovem, eles completavam a plantação e a colheita todos os anos para que houvesse sempre tabaco para as cerimónias e orações especiais. Hoje a Sociedade do Tabaco raramente planta e colhe o tabaco. Praticamente todos os membros já não existem e muito poucas adoções acontecem, pelo que menos e menos pessoas conhecem a correta maneira de realizar a cerimónia e de cuidar do tabaco. Acredito que a última vez que eles tiveram uma cerimónia especial de plantação foi há vários anos no lugar da minha irmã, mesmo abaixo de onde o meu irmão vive hoje. Eles erguiam as suas tendas lado a lado e realizavam as suas cerimónias durante um ou dois dias. Então eles saíam e plantavam as suas plantas de tabaco. A planta cresce todo o Verão e eles colhem-na no Outono com outra cerimónia. Eu não me encontrava presente na altura da cerimónia da plantação, mas foi-me dito que produção de sementes e a colheita foram muito pobres. A planta não é uma planta muito forte e então parece que poderá desaparecer em breve. Não deverá restar mais da planta já que esta particular planta é apenas usada pelo Corvo.3

A profecia do Corvo índio conta que quando esta planta desaparece, quando não é plantada e colhida pelo que não existirá reprodução da semente, então finalmente, será o fim do tempo e o mundo acabará. Parece que esse tempo se encontra próximo. Eu não me encontrava lá nesse Outono quando eles foram para o juntar, mas eles contaram-me que não conseguiram grande produção de semente nesse ano. O que eles possuem irá eventualmente tornar-se velho e não produzirá mais, não se irá renovar, e tal será provavelmente o fim.

Existem profecias de outras religiões que também falam sobre o fim do tempo.4 As profecias Hopi são muito interessantes de escutar. Conheci Thomas Banyacya algumas vezes, e ele é muito bom a explicar as profecias Hopi.5

É importante que os jovens entendam e sigam as suas religiões tradicionais. Devemos ajudar a propriamente educar os nossos jovens acerca das nossas tradições. Eu sempre tento encorajar os jovens a esquecer as outras coisas que eles têm na mente: “Larga essas coisas e tenta aprender algo sobre as tuas vias índias tradicionais.”6 Eles deveriam juntar-se a esses encontros que os índios estão a realizar e tentar o uso das diferentes cerimónias e a prece de acordo com a herança índia.

Algumas pessoas podem pensar, “Rezar não traz qualquer bem; nada irá mudar.” Mas existem muitas razões para rezar e essas pessoas estão erradas. Só Deus sabe quando o fim deste mundo acontecerá, e quando e como acontecerá dependerá certamente das orações sinceras que Lhe são oferecidas da maneira correta. Cada homem desaparecerá desta terra no seu tempo próprio. Algumas das profecias apenas falam apenas sobre o fim do tempo; outras falam sobre a fragmentação do mundo moderno, como o conhecemos, e um regresso às vias tradicionais dos nossos antepassados. Não posso dizer o que irá acontecer e se encontraremos as vias espirituais dos nossos antepassados neste mundo ou noutro; mas sei que em ambos os casos teremos ainda de fazer uma escolha, cada um de nós tem de escolher neste momento presente que caminho seguir. As orações de cada pessoa podem ajudar toda a gente. A pessoa que reza e relembra Deus receberá o maior benefício para ele e para os outros.

Algumas pessoas não acreditam que realmente possuem a opção em seguir a religião e de se virar para a oração. Esta é uma ideia estranha. Todos têm uma mente livre e a qualquer momento todos os indivíduos podem escolher uma coisa em vez da outra. Pense sobre isto. Até uma criança não tem que obedecer aos seus pais; ele pode escolher o castigo que irá receber se ele em vez desobedece. Então também pode cada pessoa escolher juntar-se a uma religião e a um caminho de oração. Existem razões diferentes porque o deve fazer: É claro que pode temer a punição como uma criança que desobedece; ou pode seguir um caminho sagrado porque conhece e ama as vias sagradas. Seja qual for a sua razão, deve escolher uma direção ou outra… Não existe algo mais que eu possa dizer exceto erguer a minha voz em oração: Durante os próximos anos, necessito da Sua ajuda para me dar o conhecimento e a força para levar a nossa Religião da Dança do Sol ao nosso povo. Tenho tentado falar alto, para que os jovens saibam o que deles é expectável. Ajude-me a levar esta mensagem aos seus corações. Estou a trabalhar com o meu neto para que esta mensagem possa ser escrita para muitos a verem. Ajude-nos. O nosso povo Apsaroke necessita ver que a sua própria religião é boa e que pode ajudá-los se apenas eles abrirem os seus olhos e corações. Todos precisam de fazer uma escolha – cada um deve escolher uma religião. Ajude-os a entender que eles devem fazer uma escolha antes que seja tarde de mais.

Você contou ao nosso povo através das nossas profecias de Apsaroke que o mundo irá encontrar um fim. As outras religiões que foram dadas aos homens brancos também falam sobre o fim do tempo. De acordo com o que nos foi dito, esse tempo deve cá chegar em breve. Ajude as pessoas ver que elas devem escolher uma religião da sua escolha. Então eles devem rezar todos os dias e viver retamente.

Houve um tempo quando todas as denominações se encontravam longe umas das outras pelo que houve uma pequena rivalidade entre elas. Tal não deve ser o caminho. Elas deviam-se unir e rezar juntas. Todas as pessoas da reserva deveriam unir-se independentemente das suas crenças. Foram dadas diferentes vias a diferentes povos por todo o mundo. Como sabemos, esta terra é redonda como a roda de um vagão. Numa roda de vagão, todos os raios estabelecem-se no centro. O círculo da roda é redondo e todos os raios vêm do centro e o centro és Tu, Acbadadea, o Criador de Todas as Coisas Superiores. Cada raio pode ser considerado como uma religião diferente do mundo, que foi dada por Ti aos diferentes povos e às diferentes raças. Todos os povos do mundo encontram-se no aro da roda e devem seguir um dos raios em direção ao centro. Os diferentes caminhos foram dados mas todos eles levam ao mesmo sítio. Todos oramos ao mesmo Deus, a Ti. Existem diferentes lugares na roda pelo que cada pode parecer estranho a alguém que siga um caminho diferente. É fácil para as pessoas dizerem que o seu caminho é o melhor se tudo sabem sobre a sua fé e tal é bom para eles. Mas eles devem evitar dizer coisas más sobre outras vias que desconhecem. Não deve haver ressentimentos sobre o outro se ele segue um caminho que leva a Ti. Ajuda-nos a encontrar esta sabedoria.

Uma pessoa deve aprender sobre um caminho para Ti antes de se lhe juntar. Não é bom entrar numa fé para de seguida deixá-la. Eu digo isto aos jovens: “Deves escolher uma religião, mas antes de entrar numa, deves saber qual é a melhor para ti. Toma tempo para encontrar tudo o que possas sobre o método de oração e sobre o que essa religião conta acerca do Criador de Todas as Coisas Superiores. Deves entender as regras e saber o que é esperado de ti. Encontra um caminho que te fornece a maneira como tens de viver uma boa vida todos os dias!”… Acbadadea, Medicina dos Pais, ajuda os jovens a conhecer estas coisas.

Algumas pessoas não querem saber o que a religião requer deles. Assim que não gostem de algo – porque não deva ser fácil ou deva requerer algum sacrifício – eles deixam-na num instante sem perguntarem-se o que Tu esperas deles. Eles não podem retirar nada de uma religião se deixam sempre que algo difícil lhes seja pedido. Se eles alguma vez encontram uma via que é tão fácil que possam tudo fazer sem qualquer problema, então eles devem saber que encontraram algo mau. Essa é a altura em que devem deixar essa falsa religião. Criador de Todas as Coisas Superiores, dá aos povos a sabedoria para ver estas coisas e a força para resistir àqueles que não Te seguirem.

Tentei expor a minha mente e o meu coração do melhor modo que sei. Obrigado por me ajudares a guiar as minhas palavras. Agora completei a minha responsabilidade de falar sobre as vias sagradas do nosso povo Apsaroke, e sinto-me bem sobre isto. Obrigado pela ajuda que Tu já me deste para que eu tenha podido levar a cabo os Teus desejos até agora. Ajuda-me a continuar a trabalhar e a orar para que esta posição de Chefe da Dança do Sol possa ser comprida e o meu povo seja permitido viver… Aho, Aho!




1 Estes ritos sagrados estão descritos em detalhes no livro Yellowtail: Crow Medicine Man and Sun Dance Chief, gravado e editado por Michael Oren Fitzgerald (Oklahoma: University of Olkahoma Press, 1991).

2 Nos vastos domínios da Natureza nos quais os índios tradicionais vagueavam, ele encontrava-se num certo sentido sem limites nesta liberdade; noutro sentido ele sempre esteve confinado ao estrito papel colocado sobre ele pelo seu universo religioso. Em todo o momento e em todo o lugar, tudo reforçava as obrigações sagradas da sua herança.

3 Em Maio de 1984, Yellowtail e eu [Michael Oren Fitzgerald.— Ed.] visitamos dois dos mais velhos membros da Sociedade do Tabaco para inquirir sobre cerimónias recentes. Ambos informantes confiram a lembrança de Yellowtail de que a última plantação teve lugar entre 1976 e 1978. Uma geada fortíssima matou todas a produção de sementes de tabaco nesse ano, e a única semente conhecida data de uma prévia plantação. Dois diferentes membros da sociedade guardam esta semente, mas não é conhecido se a semente irá germinar, e não existem plantações marcadas por esta altura.

4 As profecias que Yellowtail discute não estão sozinhas entre os índios das planícies. Por exemplo, os Sioux têm o simbolismo do búfalo e das suas quatro patas. Cada ano o búfalo perde um pêlo de uma das pernas. O fim do ciclo chega quando o búfalo não mais tem pêlos nas suas pernas. (Os hindus têm uma profecia praticamente semelhante.) Ainda, os índios pressentem que a civilização industrial, já que fragmenta o balanço da Natureza, não poderá continuar.

5 Esta carta, assinada por Thomas Banyacya em nome de todos os Líderes da Vila Tradicional Hopi, foi enviada ao Presidente Richard Nixon em 1970:
 Nós, verdadeiros e tradicionais líderes religiosos, reconhecidos como tais pelo Povo Hopi, mantemos total autoridade sobre toda a terra e vida contida no Hemisfério Ocidental. A nossa intendência é-nos adjudicada pelo nosso entendimento em relação ao significado da Natureza, Paz, e Harmonia como falado ao nosso Povo por Ele, conhecido de nós como Massau’u, O Grande Espírito, que há muito tempo atrás forneceu-nos as tábuas de pedra sagradas que preservamos até ao dia de hoje. Por muitas gerações anteriores à vinda do homem branco… o Povo Hopi viveu no lugar sagrado conhecido por si como o Sudoeste e conhecido para nós por ser o centro espiritual do nosso continente. Todos nós da Nação Hopi que seguiram o caminho do Grande Espírito intransigentemente têm uma mensagem à qual estamos comprometidos, através da nossa profecia, a qual agora lhe transmitimos.
O homem branco, através da sua insensibilidade aos modos da Natureza, tem profanado a face da Mãe Natureza. A capacidade da tecnologia avançada do homem branco ocorreu como um resultado da sua falta de consideração pelo caminho espiritual e pela via de todos os seres vivos. O desejo do homem branco por possessões materiais e por poder cegou-o à dor por ele causada à Mãe Natureza na sua busca pelo que chama recursos naturais. E o trilho do Grande Espírito tornou-se mais difícil de ver por quase todos os homens, até por muitos índios que escolheram em vez seguir o caminho do homem branco…
Hoje as terras sagradas onde os Hopi vivem estão a ser profanadas por homens que buscam carvão e água do nosso solo para poderem criar mais poder para as cidades do homem branco. Isto não pode ser permitido continuar pois se tal acontece, a Mãe Natureza irá reagir de tal modo que quase todos os homens sofrerão o fim da vida tal como o conhecemos. O Grande Espírito disse para não se permitir que isto continue até porque foi profetizado pelos nossos antepassados. O Grande Espírito disse para não tirar desta Terra – para não destruir as coisas vivas. O Grande Espírito, Massau’u, disse que o homem era suposto viver em Harmonia e manter uma terra boa e limpa para todas as crianças que virão. Todo o Povo Hopi e outros Irmãos índios mantém-se neste princípio religioso e o Movimento de Unidade Espiritual Tradicional hoje esforça-se para acordar o espírito da natureza no povo índio por toda esta terra. O seu governo quase destruiu a nossa religião base, a qual de facto é um modo de vida para todas as populações nesta terra do Grande Espírito. Sentimos que para sobreviver o vindouro Dia da Purificação, devemos voltar aos princípios religiosos básicos e encontrarmo-nos juntos nesta base como líderes do nosso povo.
Hoje praticamente todas as profecias tornaram-se realidade. Grandes estradas como passagem de rios através da paisagem; o homem fala para o homem através de teias de aranha feitas por linhas telefónicas; o homem viaja através de estradas no céu nos seus aviões; duas grandes guerras foram lançadas por aqueles apoiam a suástica ou o sol nascente; o homem está a interferir com a Lua e com as estrelas. A maior parte dos homens desviaram-se do trilho que nos foi demonstrado pelo Grande Espírito. Só Massau’u sozinho é grande o suficiente para mostrar o caminho de volta para Ele.
É dito pelo Grande Espírito que se uma cabaça de cinzas é depositada na Terra, muitos homens irão perecer e que o fim deste modo de vida se encontra próximo. Nós interpretamos isto com o largar de bombas atómicas em Hiroxima e Nagasaki. Nós não queremos ver isto a acontecer em nenhum lugar ou em nenhuma nação de novo, mas pelo contrário devemos direcionar toda esta energia para propósitos pacíficos, não para a guerra.
Nós, os líderes religiosos e legítimos porta-vozes da Independente Nação Hopi, fomos instruídos pelo Grande Espírito para expressar o convite ao Presidente dos Estados Unidos e a todos os líderes espirituais em todos os locais para se encontrarem connosco e discutir o bem-estar da humanidade para que a Paz, Unidade e Irmandade se tornem parte de todos os homens em toda a parte.

6 Chefe Fools Crow, Teton Sioux, comentou este mesmo ponto:

Decidi ir de novo a Bear Butte para jejuar e rezar… e sabe o que aconteceu? Wakan Tanka e Tunkashila deram-me a mesma resposta que me foi dada na minha viajem lá em 1927. Os Sioux deviam voltar e escolher as coisas boas que os nossos avôs, avós, tias, tios, pais e mães nos ensinaram. A nossa única esperança era voltar ao nosso modo tradicional de vida. Era a única fundação que tínhamos que nos dava significado e propósito. Eu trouxe esta mensagem de volta para os anciãos… (Thomas E. Mails, Fools Crow [Garden City: Doubleday, 1979])

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