Que na Europa e um pouco por todo o
Mundo se vive um período de decadência e dissolução é por demais evidente para
todos aqueles que têm olhos de ver.
A estas nuvens negras assombradoras sempre houve
forças que se opuseram. Se ainda há alguns séculos, e em alguns casos décadas,
o combate ainda se fazia no seio da sociedade, na academia, no setor económico,
político e inclusive no campo militar, cabe hoje reconhecer, especialmente no
mundo ocidental, a derrota das forças reacionárias, já que os tentáculos
progressistas podem reclamar uma vitória quase total, pelo que a sua mundivisão
reina incontestada, tendo tomado de assalto todas as instituições públicas.
O homem de bem, de forma consciente e inconsciente,
sentindo-se instintivamente repelido pela nova ordem negra, faz por reagir: ora
ainda tenta criar forças políticas (cada vez mais pequenas e de diminuta
expressão), movimentos culturais, associações mais ou menos nostálgicas, debate
de ideias dentro do seu círculo próprio e, aqui e ali, atos violentos de
caráter desesperado.
Reconhecendo o mérito de todo o tipo de reações contra
o tal “estado das coisas”, parece-me que, descontando as pírricas pequenas
vitórias que ainda acontecem, todos estes atos têm-se revelado ineficazes face
à crescente avalanche de ondas maléficas, pelo que podemos considerar tais
atitudes no fundo infrutíferas no grande esquema da situação atual.
Não sendo o acima descrito surpreendente para todo
aquele que olha a presente situação com distância e discernimento, cabe-me
apontar uma crescente lacuna na chamada atividade de “contra-ataque”, e que
parece esquecido ser a mais importante: a nobreza.
Na Europa - e em todas as antigas sociedades ditas
tradicionais – sempre houve uma classe “social” que incorporava em si valores
sob os quais todas as outras classes e estruturas comunitárias se submetiam.
Não querendo entrar aqui em discussões profundas sobre a relação da nobreza com
a igreja, cabe reconhecer que aquela, no geral, sempre ocupou, nem que fosse só
pela primazia que possuía em termos de força militar, o lugar de topo na
sociedade antiga, que exerceu sempre em nome próprio ou por submissão
voluntária ao mandato religioso.
Se a nobreza, principalmente desde o período da
chamada Baixa Idade Média, esteve essencialmente ligada ao acima referido poder
militar e ao domínio de largas porções de terra, como função social externa,
cabe reconhecer que ela era e sempre foi – mesmo não o sabendo – a depositária
de um conjunto de valores e códigos que superavam em muito tais funções
seculares.
Tendo origem imemorial e divina (o seu estabelecimento
está consagrado em todos os textos sagrados indo-europeus), a nobreza,
especialmente na era pré-cristã, era reconhecida como a depositária dos valores
de origem supranatural representantes da elevada espiritualidade que
atravessava todas as verdadeiras civilizações do mundo, reflexo terrestre da
herança primordial hiperbórea.
E se nos tempos mais recentes, esta “classe” (melhor
diríamos - ordem) se secularizou em todo o mundo, passando a estar somente
ligada a funções militares e à possessão de terras, a sua importância, como
depositária espiritual desse legado primordial, esteve no fundo ligada à sua
função de ponte entre o elemento terrestre e o elemento sobrenatural, que é a
razão primeira da sua existência em todas as sociedades tradicionais, da
América ao Japão.
Esta função natural, fruto da dignidade própria de
seres portadores deste legado supra-pessoal, era reconhecida pelos restantes
elementos da sociedade, que livremente se submetiam a esta estirpe superior,
que simbolizavam o elemento divino ao qual todas as estruturas sociais,
atividades, atos e comportamentos se subordinavam e que tinha no seu vértice a
figura do Rei, portador máximo desta dignidade, o mais nobre dos nobres.
Aos nossos contemporâneos é quase impossível entender
(incapacitados que estão pela historiografia moderna de vertente historicista,
secular e materialista) a verdadeira natureza deste organismo piramidal, comum
a toda a antiga humanidade que se regia por princípios imemoriais de alta
espiritualidade, que não era mantida nem pela força militar ou pela violência
(e muito menos por superestruturas de opressão económica, como são de grosso
modo as sociedades contemporâneas), mas pelo facto de aquelas se orientarem
pelo elemento divino e portanto reconhecerem uma classe de seres que possuíam
em si essa componente divina – a nobreza, os únicos homens livres.
Olhando agora para o mundo moderno, parece então fútil
perder tempo e entrar em discussões estéreis sobre possíveis alternativas
políticas, modelos económicos, análises sociológicas, interpretações “geopolíticas”,
ações militares, etc., sem fazer referência ao que causou verdadeiramente a
derrocada em que nos encontramos e todas as confusões atuais: o desaparecimento
de uma estirpe humana que servia de farol ao resto das massas humanas, que pela
sua condição funcionava como reflexo da luz divina e mantinham, mais por estas
qualidades que por meras ações externas, presentes no campo terrestre elementos
desta solaridade primordial que moldava o organismo social e as ações dos
homens submetidos a elas, refreando o elemento demónico que sempre anseia por
espalhar o caos por entre as brechas abertas.
Acima de tudo, o apelo que tem de ser feito é aquele que
relembra a todos os homens que sentem dentro de si o chamamento para reconectar
o seu ser com esse elemento solar, já que, não havendo hoje instituições
iniciáticas que permitam a sua ativação, tal só se poderá fazer por um ato de
vontade individual de atingir o absoluto.
Esta estirpe de seres nada tem a ver com as “nobrezas”
modernas, que no seu esclerosismo mais não são que relíquias vegetativas de um
passado que também não compreendem e cuja ligação é feita somente pelo brasão
ou apelido, já que o espírito há muito o perderam, pelo que, sem ação interna,
continuarão a ser meros espantalhos a caminho da extinção final.
O verdadeiro nobre do futuro será aquele que, como os
nobres da antiguidade, não se revê no fluxo da matéria; aquele que se conhece como
sujeito e não objeto; que desdenha as massas; que se mantém sempre digno,
centro de si próprio; que não é “atuado” mas que atua; soberano da sua mente e
demais sentidos; que não é influenciado e também não se incomoda; o que age em
função do bem e justo, porque tal é a sua natureza; aquele que possui e que
nunca é possuído; que não se rege por códigos externos nem porque teme o
pecado; o que sabe que a manutenção da ordem e justiça depende da sua conduta
externa e interna; que se mantém vertical e para qual a mentira é tão grave
como o mais abjeto crime; aquele para quem a experiência religiosa será sempre
uma afirmação da sua vontade e identificação desta com o ato, que se manifesta
na sua constante atualização.
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